Em 20 de outubro de 1846, Dostoiévski escrevia a seu irmão: “Todos os meus planos foram por água abaixo e ruíram por si mesmos… Abandonei tudo [que estava escrevendo], já que isso não passava de uma repetição de coisas velhas. Agora ideias mais originais, vivas e luminosas brotam de mim no papel… Estou escrevendo outra novela, e o trabalho vai de vento em popa, está saindo com facilidade e frescor, como nunca…”.
A novela a que Dostoiévski se referia com tamanho entusiasmo era A senhoria, que viria à luz no ano seguinte. Ao contrário de suas expectativas, entretanto, Bielínski – o mais influente crítico literário da época – tratou a obra como um disparate, fruto da “fantasia mirabolante” do autor.
De fato, as inovações que Dostoiévski introduziu com relação ao foco narrativo – bem como a trama que liga o intelectual e sonhador Ordínov à figura misteriosa de Katierina – permaneceram totalmente incompreendidas em seu tempo. Só no século XX, uma nova geração de leitores iria reconhecer neste livro, escrito quando o autor tinha 26 anos, uma obra-prima que antecipa Memórias do subsolo (1864) e seus grandes romances da maturidade.
Pela primeira vez em tradução direta do russo, A senhoria conta, nesta edição, com catorze xilogravuras de Paulo Penna e um esclarecedor posfácio de Fátima Bianchi, no qual a tradutora reconstitui o conturbado ambiente literário da época, destacando a atualidade da contribuição de Dostoiévski.
Sobre o autor
Fiódor Mikháilovitch Dostoiévski nasceu em Moscou em 1821, e estreou na literatura com o romance Gente pobre, em 1846, ao qual se seguiram O duplo (1846) e Noites brancas (1847), entre outros. Após ser preso e condenado à morte pelo regime tsarista em 1849, teve sua pena comutada para quatro anos de trabalhos forçados na Sibéria, experiência retratada em Escritos da casa morta, livro que começou a ser publicado em 1860, um ano antes de Humilhados e ofendidos. Após esse período, escreve Memórias do subsolo (1864), Um jogador (1867), O eterno marido (1870) e uma sequência de grandes romances, Crime e castigo (1866), O idiota (1869), Os demônios (1872) e O adolescente (1875), culminando com a publicação de Os irmãos Karamázov em 1880. De 1873 até o ano de sua morte publicou ainda o Diário de um escritor, reunindo peças jornalísticas e de ficção. Reconhecido como um dos maiores autores de todos os tempos, Dostoiévski morreu em São Petersburgo, em 1881.
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